O Salto Azul é um projeto de conscientização do autismo utilizando o paraquedismo para trazer luz e reflexão na necessidade de defesa e proteção desses indivíduos vulneráveis, especialmente na fase infantil.
Por Rejane Damasceno
O evento do Salto Azul reuniu mais de 500 pessoas na Céu Azul em Piracicaba, totalizando mais de 1000 pessoas nos 3 eventos.
O Salto Azul surgiu do desejo de unir as minhas duas paixões: o paraquedismo como modalidade esportiva e a minha profissão como terapeuta ocupacional. No paraquedismo realizei perto de 140 saltos, somados durante o período de dois anos que me iniciei no esporte. Já na terapia ocupacional, atuo há 16 anos no desenvolvimento de crianças com transtorno do espectro autista. E foi através de uma conversa com a Mariana Fernandes, Advogada e Mestre em Direitos Humanos, percebi que tanto no contexto do esporte como na minha profissão, enfrento diariamente o preconceito social que existe pela constante falta de compreensão e informação. E por isso decidimos elaborar juntas o projeto Salto Azul.
As idealizadoras da iniciativa Rejane Damaceno e Mariana Fernandes. No meio delas um cão terapeuta.
O paraquedista em um momento ou outro é taxado como louco, a tal ponto de ouvir: “se fosse para voar, você teria nascido com asas”. Isso, por mais que haja um pouco de humor arraigado, é uma condição de preconceito que é muito comum em indivíduos atípicos e seus familiares no dia a dia. O preconceito vem desde situações das mais simples, passando por outras bem desconfortáveis em várias instâncias, com diferentes formas de exclusão. Seja na esfera emocional, física e social, as quais podem ser percebidas em diferentes contextos. Olhares de julgamento, uma matrícula recusada na escola e até mesmo em deixar de ser convidado para uma festinha de aniversário do colega da escola. O preconceito está aí e precisamos combatê-lo. Acolhimento é a palavra chave.
Orientação é a chave
Sabemos que para muitos não é simples voar, aliás, pode até parecer desesperador, mas após a decisão do primeiro salto, estando munido dos equipamentos e profissionais habilitados, há não só a esperança, mas a real possibilidade de desenvolvimento e superação de limites, superação esta que também é perceptível em meu contexto profissional.
Como terapeuta ocupacional especialista em saúde mental, acompanho diariamente famílias que acabaram de receber o diagnóstico de autismo de um filho. E assim como no primeiro salto, os familiares se sentem incapazes, amedrontados e angustiados, justamente por parecer improvável a possibilidade de voar ou no caso dos indivíduos do espectro autista, de se desenvolver. Como se fosse algo tão difícil que não há métodos e soluções possíveis. Mas tanto no paraquedismo como na terapia ocupacional, com os profissionais e ferramentas adequadas, é possível superar todos os limites.
Sala sensorial para acalmar e incluir os participantes do evento.
Acompanhar o desenvolvimento de crianças atípicas é vivenciar uma experiência única. A cada passo das crianças, a cada novo desafio superado, seja encaixando uma peça, retribuindo um sentimento, fazendo novas receitas e tantos outros exemplos que acompanho de perto, posso garantir que é possível superar cada obstáculo que apareça. É possível até mesmo voar!
Atividades sensoriais, como o simulador de saltos, estiveram presentes nas atividades do evento.
Dentre tantas outras atividades, para a manutenção da qualidade de vida de quaisquer indivíduos que precisam ser notados, a visibilidade da prática esportiva como o paraquedismo em um projeto pioneiro como o Salto Azul, chama atenção da sociedade à conscientização do autismo e, consequentemente, traz reflexão sobre a necessidade de defesa e proteção destes seres vulneráveis e passíveis de proteção integral.
Informação e Acolhimento
Apesar de toda a informação circundante nas redes, a sociedade brasileira ainda sabe pouco sobre a condição do autista. Observa-se constantes dúvidas a respeito de como ensinar crianças e adolescentes com autismo na escola, como recebê-los no comércio, no banco, ou até em práticas esportivas como o paraquedismo.
As pesquisas informam que os indivíduos com transtorno de espectro autista estão em toda parte, conforme dados divulgados este ano, nos Estados Unidos, o CDC (Centers for Disease Control and Prevention – Centros de Controle e Prevenção de Doenças), divulgou que uma em cada 36 crianças foi identificada com transtorno do espectro do autismo (TEA). Se considerarmos estas informações, provavelmente todos conhecem e até convivem com um indivíduo com TEA e mesmo diante destas estimativas, infelizmente poucos sabem ou se interessam sobre o assunto.
Paraquedismo & Autismo – o Salto Azul
Inclusive, pode até causar estranheza tratar sobre um esporte radical como o paraquedismo e correlacioná-lo ao autismo. Contudo a interdisciplinaridade que o projeto oferece nos estimula o despertar em diferentes áreas, articulando pontos de cruzamento entre diversas atividades. Além de ser uma forma diferente de abordar o tema, o que atrai ainda mais a atenção das pessoas.
O Lucas de Piracicaba é autista e foi o ganhador do salto salto duplo. Ele nunca tinha andado de avião. Foi um dia de muita emoção para ele na Skydive Cerrado.
Dentre tantas outras atividades para a manutenção da qualidade de vida de qualquer indivíduo, a prática esportiva, sem dúvida, é indicada para desenvolver habilidades, tais como: interação social, comunicação, cumprimento de regras, espírito de equipe e troca de turnos, característica estas que são tão valiosas para autistas.
Entretanto, apesar dos aviões e dos paraquedistas que formam a palavra AUTISMO em queda livre proporcionarem um mundo totalmente inusitado e, aparentemente, fora da realidade de muitos, essas atrações não são o objetivo principal e finalidade do Projeto Salto Azul.
Chamar atenção e promover aceitação
O Salto Azul é um momento para difundir a informação relativa ao transtorno e suas implicações através do esporte, uma excelente oportunidade de promover a aceitação, a difusão da informação e de chamar a atenção do público em geral para as milhares de pessoas que vivem o autismo diariamente, dentre elas os próprios autistas, seus familiares e profissionais envolvidos no tratamento, e na inclusão e INTEGRAÇÃO destes seres.
Esse evento traz luz a uma importante rede de apoio existente e disponível o ano todo, além de oferecer um momento de cuidado também para os familiares que enfrentam grandes desafios.
Além do evento em si, e o trabalho contínuo durante o ano, promovemos inúmeros eventos on-line com entrevistas junto a especialistas da área da saúde, direito, personalidades atípicas, pais e mães atípicos. Sempre fomentando discussões, trocando experiência e compartilhando informações importantes ao público.
Como gostamos de mencionar: enquanto para muitos o céu é o limite, o projeto salto azul já iniciou superando todos os limites, levando o autismo até para o céu, contando com uma rede de apoio de muitos profissionais que trabalham em prol da causa no céu e em solo.
Anápolis, Piracicaba e em Setembro, Boituva
Os eventos do projeto Salto Azul já ocorreram no Estado de Goiás, com 2 edições na Skydive Cerrado em Anápolis e no Estado de São Paulo, com edição em Piracicaba na Azul do Céu Paraquedismo, somando um público presente de mais de 1000 pessoas que abraçaram a causa tornando-se verdadeiras peças que combatem o preconceito “até no céu”.
Equipe da organização do Salto Azul já programou o próximo para Boituva em 23 de setembro
O paraquedismo chama atenção não apenas como modalidade esportiva. O paraquedismo supera limites muito além do esporte e nesse projeto se tornou um verdadeiro instrumento no combate ao preconceito e já está com data marcada para a próxima edição que ocorrerá em Boituva, SP, dia 23 de setembro do corrente ano. Venham participar e contribuir pela causa.