Com apenas 17 anos ela já fez o primeiro duplo, o curso AFF e hoje é recordista brasileira
Por Nátalie Zampoli Gabriel
Quando era criança tive muito pouco contato com o paraquedismo apesar de meu pai ter sido um atleta atuante em Americana, como instrutor ASL nos idos de 1990, formando mais de 500 alunos. Pouco antes de eu vir ao mundo, ele parou de saltar. Assim, durante minha infância, nunca tinha conhecido uma Drop Zone. O único contato que tive com o paraquedismo foram uma foto que ficava na parede de casa e as histórias que meu pai contava bem diante de meus olhos admirados. Inúmeras demonstrações em estádios de futebol e outros locais inusitados, perfis curiosos e histórias de seus alunos, até como funcionava um paraquedas. Por conta desses incontáveis relatos, eu acabei desenvolvendo muita curiosidade sobre o esporte. Cada uma delas, seguiam mais de mil perguntas.
Foram tantas histórias e tanta curiosidade que por volta dos meus dez anos eu já expressava minha vontade de saltar. Mas eu precisava esperar a idade mínima para o salto duplo que, à época, era de 14 anos. Passei a contar os segundos para esse momento chegar e pouco antes de eu completar meus 14, fomos para a área de Boituva pela primeira vez. Lembro da minha ansiedade na noite anterior pensando no momento que eu materializaria muito do que estava no meu imaginário de tanto escutar o meu pai.
Chegando lá, meu pai realizou alguns saltos de readaptação, já que fazia muitos anos que ele não saltava. O intuito era de poder subir no meu salto e filmar esse momento. Eu adorei conhecer o ambiente do CNP e ver meu pai saltando. Era um mundo novo pra mim apesar de já ter um escopo imaginário e me encantei com tudo o que vi. Agora a ansiedade começava a apertar o peito, de uma forma carinhosa, ansiosa para o grande dia.
Comemorei meus 14 anos fazendo meu primeiro salto duplo pela Flight Paraquedismo, escola que meu pai e meu tio Edson Ricardo Rossi (Terror) começaram juntos em 1995 em Americana. Meu pai foi de câmera e meu instrutor foi o Salim, o qual até hoje tenho grande carinho e admiração por ter sido a pessoa que me apresentou o céu e me mostrou pela primeira vez o que é voar.
Eu estava muito ansiosa pra saber qual seria a sensação de saltar, mas lembro que não sentia medo. Nem no avião, nem na hora do salto. Talvez por vivenciar tantas histórias empolgantes que meu pai contava? Não sei. Só me lembro que o sentimento mais presente era de muita alegria e da realização de um sonho.
E ver meu pai em queda livre foi algo incrível! Muito legal! Na decolagem seguinte, minha mãe também saltou com o Salim com meu pai filmando. Foi o segundo duplo dela. Meu aniversário não podia ter tido melhor presente.
Depois desse salto eu já tinha a certeza que queria virar paraquedista, sentir a sensação de voar sozinha e ser uma atleta igual às pessoas que eu conheci aquele dia na área. Mas essa ideia ainda estava um pouco distante.
No meu aniversário de 15 anos, pedi outro salto duplo de presente, já que ainda não tinha idade para fazer o curso. Saltei novamente com o Salim e meu pai de câmera. E foi uma sensação muito boa voltar para o céu. Quando pousamos tive a certeza de que queria fazer aquilo mais vezes. A partir daí começamos a frequentar a Skydive Thru em Piracicaba e eu não via a hora de poder começar o curso AFF.
Na semana em que eu completaria 16, fiz meu curso teórico em Piracicaba com o Renan Seccomandi e fui voar no iFly em São Paulo pela primeira vez. Com ele e a Rita Brindelli. Foi uma experiência muito diferente e meu pai ficou super emocionado em me ver voando. E assim, em 14 de fevereiro de 2021, dia do meu aniversário, fiz meu primeiro salto do AFF com o Renan e o Toshimi de instrutores. E mais uma vez, lá estava ele: meu pai de câmera. Foi um dia pra lá de especial!
Eu não fazia ideia com que frequência eu continuaria saltando depois do curso, então aqueles sete saltos eram tudo o que eu tinha e aproveitei demais cada segundo. Demorei quase três meses pra me formar devido ao fechamento da área na pandemia. Mas no dia em que realizei o nível 7 do curso, recebi um convite da Pati Carvalho e da Bia Ohno, que também foi minha instrutora no AFF, para participar dos treinos para o Recorde Feminino. Isso foi uma grande surpresa. E fazer parte do recorde tornou-se uma meta. Virei ratinha de aeroporto, indo para a área todos os finais de semana.
E durante minha progressão nas categorias AI e A, a maior parte dos meus saltos foram de 2way com meu pai – olha ele aí de novo -, treinando exercícios de BBF. Treinei também com a Bia no iFly e depois de passar para categoria B, comecei a participar de eventos de Big Way. Circulei pelo Record Hunters, Foo-X, CTR, e em todos os eventos bimestrais de treino do Recorde Feminino.
A área de salto, em especial a Skydive Thru, virou minha segunda casa e o paraquedismo minha paixão e maior motivação, surgindo um convite em julho do ano passado para compor um time de 4way representando a escola Sky Flow no Campeonato Brasileiro de FQL. O time era formado pela Soraya Ribeiro, Michelle Rodrigues e Dani Viecceli, com o Messias de câmera. Foi muito emocionante e tive a oportunidade de hastear a bandeira do Brasil no meu primeiro campeonato, junto com o Elson Passos, por ser a mais jovem atleta da competição. E conquistamos o terceiro lugar.
Logo depois, tive a oportunidade de participar do tryout para o Recorde Total Break, onde voei pela primeira vez com os aviões em ala. Fiquei o voo todo olhando pela janela, admirando o outro avião ao nosso lado, muito feliz e emocionada. E então chegou o convite por e-mail dizendo que eu havia sido selecionada para participar da quebra do recorde.
Alguns dias antes do evento do recorde eu já estava em Boituva trabalhando como câmera pelas escolas e estava me sentindo preparada. Porém, logo no primeiro dia do evento, não foi nada fácil. Eu acordei resfriada e bem indisposta fisicamente, e tive que me esforçar ao máximo para me manter focada nos saltos. E mesmo não me sentindo tão bem, estava muito feliz e realizada por estar ali.
Já no segundo dia eu estava bem melhor e foi quando começamos de fato as tentativas de quebra do recorde. Todos os saltos foram experiências únicas, desde os briefings formando as figuras no chão e reunindo toda a energia da galera pra fazer aquilo acontecer no céu, até a logística dos quatro aviões voando juntos. O suporte de oxigênio na subida, que era uma novidade pra mim e a expectativa lá no alto de que o próximo salto seria o grande salto do recorde. Tudo novo e muito empolgante!
Além de ter participado desse momento marcante pra mim e para o nosso esporte com a quebra do recorde total break – uma formação de 42 atletas com dois pontos -, a parte mais especial foi dividir o céu e todas essas emoções com tantas pessoas especiais que conheci. E mais especial ainda, dividir com quem me ensinou a voar.
Eu e o Renan, meu instrutor AFF, estivemos juntos nesse momento. Foi no terceiro dia, segundo salto, quando todos mentalizamos que o próximo seria o do recorde. O salto foi perfeito e eu pousei muito animada, mas esperando pra comemorar só quando anunciassem que o recorde estava batido. E momentos após o pouso, era oficial! O sentimento de conquista e alegria transbordante, comemorando com todos os recordistas, vão ficar marcados na minha memória.